Por
Reinaldo Azevedo
O
procurador-geral da República, Roberto Gurgel, leu ontem a sua peça acusatória.
Ao longo de mais de cinco horas, relembrou a penca de crimes cometidos por
aqueles que ficaram conhecidos como "mensaleiros", um neologismo derivado de
outro, "mensalão". São nomes-fantasia para designar uma teia de atos criminosos
que atendem por “peculato, formação de quadrilha, corrupção ativa, corrupção
passiva” e por aí afora. O relato foi muito impressionante! Dado o número de
réus - 38 (ele pediu a condenação de 36) -, ao individualizar os crimes, não
pôde dispensar mais do que cinco ou seis minutos por acusado. Poucos eventos
ali eram novidades para quem, a exemplo deste escriba, é obrigado a acompanhar
o caso até por dever profissional. Mesmo assim, o quadro é espantoso!
Pensem
numa secretária que, a pedido de seu chefe - um publicitário que detém contas
de estatais -, vai sacar, de uma só vez, R$ 600 mil no banco para fazer
pagamentos em espécie. Foi preciso mobilizar um carro forte e seguranças! Isso
acontecia, como disse o sambista Chico Buarque, enquanto a "pátria
mãe dormia tão distraída, sem saber que era subtraída em tenebrosas
transações". Ao contrário até, não é? Para todos os efeitos, estava em curso a
redenção do povo - e há quem acredite sinceramente nisso.
Empréstimos
fraudulentos foram feitos por instituições bancárias que tinham interesses em
decisões do governo. Na prática, bancos apenas lavaram dinheiro cuja origem
eram os cofres públicos. Assim, o que se sabe de inequívoco? OS CRIMES
ACONTECERAM! A origem do dinheiro que alimentou o que se chamou "mensalão" - e
poderia se chamar "torta de framboesa", sem que isso mudasse a natureza das
coisas - era criminosa. Sua destinação atendia a interesses do Partido dos
Trabalhadores. Gurgel relatou casos de incrível coincidência entre votações no
Congresso, saques na boca do caixa e pagamentos.
É
claro que a defesa vai alegar que são todos inocentes, e eis um direito
sagrado, inviolável e intocável da democracia: o de defesa. É de tal sorte
sagrado que, quando o pior dos bandidos não puder arcar com o custo de um
advogado, o estado faz isso por ele, indicando o seu defensor. Não se cuida
aqui de demonizar os doutores, não! Ao contrário. Ainda ontem, debati em
companhia de Roberto Podval, um dos maiores criminalistas do país. E me senti muito honrado por isso. A questão não está em relativizar o
direito de defesa, mas em seguir o curso lógico das coisas. Ora, os crimes
aconteceram. Se aconteceram, então há os criminosos. Eles precisam ser
apontados e, para o bem do Brasil e dos brasileiros, têm de ser punidos.
A tese
do caixa dois de campanha, com a qual o PT e Márcio Thomaz Bastos tentaram
mesmerizar o país, não dura cinco minutos. Não se tem o caso de a empresa
privada A ou B a doar dinheiro por fora ao PT, que, então, teria deixado de declará-lo
à Justiça Eleitoral… Foi caixa dois, Delúbio? Qual a origem do dinheiro,
valente? Para não ter de responder a essa pergunta, inventou-se a história dos
supostos "empréstimos" - uma peça de ficção. Parte da campanha eleitoral de
Lula foi paga ao longo de 2003 numa conta que Duda Mendonça mantinha no
exterior - aberta, ele confessou, por sugestão de Marcos Valério. "Tá vendo?
Caixa dois, Reinaldo!" Na destinação, pode ser. O ponto é outro: qual é a
origem?
Acho
que Roberto Gurgel determinou com precisão o papel de cada um no esquema
criminoso. "Mas é o bastante?" Já tratei do assunto num post ontem, abordei no
debate que fizemos na VEJA e relembro aqui: os crimes de que estão sendo
acusadas algumas ex-autoridades, como José Dirceu, dispensam o "ato de ofício".
O direito, entendo, não pode desprezar o que se chama "ordem dos fatos".
E foi
isto o que o procurador-geral da República apontou ontem: OS FATOS. Seiscentos
mil fatos tiveram de ser transportados num carro forte!
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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