Editorial
O ministro Joaquim Barbosa, do STF, frustrou mais uma
tentativa de retardar o julgamento do processo do mensalão ao indeferir
requerimento do advogado Marcio Thomaz Bastos para que os autos fossem
desmembrados, para que os 35 réus - dos 38 - que não desfrutam de foro privilegiado
sejam julgados em primeira instância, deixando na Suprema Corte apenas os três
deputados que, por prerrogativa de função, têm esse direito. De acordo com a
Folha de S.Paulo (9/5), para Barbosa "a questão relativa ao desmembramento
do feito em relação aos réus que não gozam de foro por prerrogativa de função
já foi, por várias vezes, apreciada nesta ação penal, sendo, em todas as
ocasiões, rejeitada". Ou seja, o STF entende que os 38 réus do mensalão
devem ser julgados juntos.
Thomaz Bastos representa no processo o diretor do Banco Rural
José Roberto Salgado, um dos 35 réus que não gozam de foro por prerrogativa de
função. Mais do que conquistar um aparente benefício para seu constituído, ao
recorrer ao STF a óbvia intenção do ilustre criminalista foi a de obter a
protelação do julgamento. Não há outra explicação para a tentativa de privar um
réu de um privilégio a que, em circunstâncias normais, não teria direito: ser
julgado pela Suprema Corte. Assim, o argumento apresentado a favor do
desdobramento do processo, levado às últimas consequências, colocaria em xeque
o próprio instituto do foro privilegiado.
Senão, vejamos: alega a petição que José Roberto Salgado, por
não ter a prerrogativa de ser julgado pelo STF, tem o direito de responder ao
processo perante um juiz de primeira instância, de modo que não se veja
privado, na hipótese de uma sentença condenatória, da possibilidade de recorrer
a uma instância superior. Por esse raciocínio, que vale para todo mundo, o foro
dito privilegiado - neste caso, o STF - representaria, na verdade, um ônus e
não um bônus, uma prerrogativa, uma vantagem privativa de altos dignitários
como o presidente da República, parlamentares federais e ministros de Estado,
entre outros. Afinal, as decisões da Suprema Corte são irrecorríveis.
Segundo o entendimento dos ministros togados, portanto, a
tramitação do processo é mantida no STF porque os réus devem ser julgados
juntos e três deles têm direito ao privilégio de foro por serem deputados
federais. Entre os 35 está José Dirceu, "o principal articulador dessa
engrenagem", de acordo com a denúncia apresentada em 2006 pelo então
procurador-geral Antonio Fernando de Souza.
É fácil de entender a preocupação de Lula e de seus
correligionários com a repercussão do julgamento do escândalo do mensalão,
exatamente no momento em que será dada a largada de nova campanha eleitoral. O
ex-presidente continua insistindo em que tudo não passa de uma
"farsa" armada contra ele próprio e seu partido.
Para ele, conforme declarou em Paris em 2006, numa polêmica
entrevista exclusiva a uma produtora independente que vendeu o material ao
programa Fantástico da Rede Globo, "todo mundo faz,
sistematicamente", aquilo de que o PT era acusado, ou seja caixa 2 - ou,
como preferia o então tesoureiro petista Delúbio Soares, "recursos não
contabilizados".
Não é bem essa a conclusão da denúncia acolhida pela Suprema
Corte. Nela, afirma o então chefe do Ministério Público federal: "Os
denunciados operacionalizaram desvio de recursos públicos, concessões de
benefícios indevidos a particulares em troca de dinheiro e compra de apoio
político, condutas que caracterizam os crimes de quadrilha, peculato, lavagem
de dinheiro, gestão fraudulenta, corrupção e evasão de divisas". E mais:
as apurações "evidenciaram o loteamento político dos cargos públicos em
troca de apoio às propostas do governo, prática que representa um dos
principais fatores do desvio e má aplicação de recursos públicos, com o
objetivo de financiar campanhas milionárias nas eleições, além de proporcionar
o enriquecimento ilícito de agentes públicos e políticos, empresários e
lobistas que atuam nessa perniciosa engrenagem".
Depois de seis anos de tramitação, o mínimo que se pode
esperar é que, sem mais delongas, o processo seja julgado.
Fonte: "O Estado de S. Paulo"
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