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sexta-feira, 3 de outubro de 2014

"'Porrada de Polícia', a gênese num encontro com um camarada meu"

Jorge Magalhães e Dionorina: parceiros em "Porrada de Polícia"
Foto: Reprodução

Por Jorge Magalhães
Esses dias, um camarada meu, um pouco cheio de dedos para não transparecer invasivo, me indagou o quanto eu teria faturado de direitos autorais com a execução, nos anos 1992 a 1994, da música "Porrada de Polícia",  uma das parcerias com Dionorina que fez um relativo sucesso nas ondas dos rádios baianos, e acabou ganhando o Troféu Caymmi de Melhor Composição, em 1993.
Indo ainda mais fundo em sua sondagem, ele também especulou sobre o que teria me inspirado ao compor a letra deste reggae, sendo uma das suas hipóteses, o fato consumado de que eu tirei os versos da canção brilhantemente musicada por Dionorina de um cenário existencial vivido por mim,  no ato da criação.
Se valendo do meu silêncio momentâneo, ante a abundância do seu inesperado interrogatório, o nobre camarada lembrou-me, com certa ênfase, que "Porrada de Polícia" além de ter tocado em todas as rádios de Feira de Santana de forma massificada, teve a sua reprodução potencializada pela TV Subaé, como de fato o foi, através de um clipe muito bem produzido pela afiliada feirense da Rede Globo,  onde a letra da música foi editada simultaneamente a imagens de fome e de violência do nosso cotidiano, inclusive com cenas reais da ação policial sobre alguns movimentos grevistas, naquele então.
Dando azo à sua fértil e criativa imaginação, este camarada meu, meio que tentando inflar-me o ego e se dizendo fã dos meus escritos - aí incluindo letras de música, poesias, matérias, crônicas, artigos jornalísticos e roteiros - neste último item  lembrou-me  o  que escrevi sobre o Mosteiro de São Bento, em Salvador,  filmado, produzido e veiculado pela Bahia Cinema e Vídeo e vertido para três idiomas sob a edição da competentíssima jornalista Soraya Mesquita.
Mas, o foco principal da sua sondagem era mesmo a música "Porrada de Polícia", para ele um "hino  contra as desigualdades sociais; uma abordagem sociológica crua e fiel  sobre a realidade das populações favelizadas pela ausência de Estado", etc. etc... Enfim, para o meu espanto absoluto, o dileto camarada afirmara, de forma peremptória, que eu  teria "faturado uma graninha legal" com os direitos autorais desta canção, a julgar, segundo ele, "pelo tempo que ela foi levada ao ar pela TV Subaé e pelos shows que abriram portas à carreira de Dionorina".
Emergindo do silêncio abissal em que até então me mantive, e, confesso, um tanto quanto absurdado, disse-lhe, de saída, que desde os 20 anos de idade tenho sobrevivido do que tenho amealhado como jornalista, passando, nesta condição, por vários órgãos de imprensa e assessorias de comunicação.
Revelei, em seguida, que o mote de "Porrada de Polícia" me veio de um episódio corriqueiro na vida de qualquer cidadão, de qualquer família, e que me fez tomar do lápis e do papel, ao  chegar em casa, após  um dos meus notívagos e fatigantes plantões  na TV Subaé (onde tive a honra de atuar como pauteiro) e,  ao ligar o fogão para esquentar o jantar preparado com esmero por Selma, o gás foi-se findando em câmara lenta, instigando  a fome canina e aguçando, ainda mais, o senso crítico e  a minha veia poética.
Disse-lhe, pausadamente, que no tocante aos direitos autorais, sim, pingaram e pingam  alguns caraminguás na minha conta na Amar, uma das afiliadas do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), desta e de outras parcerias, mas nada que me permitisse botar o burro na sombra, já que até aqui tenho sido gravado por poucos cantores e nenhum, infelizmente, com o calibre de uma grande gravadora para gerar dividendos autorais com a veiculação, circulação e vendagem das minhas composições.
Quanto a veiculação de "Porrada de Polícia" pela TV Subaé, ponderei-lhe que vivi experiência similar com o clipe de "Cheiros e Temperos", parceria com Rá Nascimento,  gravado por Danny Nascimento (ex-Fama, hoje vocal de Daniela Mercury), especialmente para  a TVE, o seu primeiro clipe institucional a ser levado ao ar no verão de 2002. Lembrei-lhe, ainda, da música "Flor Cristalina", minha e de Rá, gravada por Luiz Caldas e Tontom Flores, até hoje veiculada na grade de programação da FM Educadora.
O que há de comum nos três casos, é que em nenhum deles recebi um centavo de direito autoral, mas, como criador, sou infinitamente grato à sensibilidade destas emissoras por ter me dado esta inefável, esta incomensurável oportunidade de divulgar o meu trabalho, levando sua mensagem para milhões de mentes e corações nos mais longínquos rincões, graças ao milagre multiplicador das telecomunicações.
Pacientemente, também lhe fiz compreender, que diferentemente dos cantores que gravam   vários compositores, parceiros ou não, é natural que todas as luzes se voltem para o artista que sobe ao palco e defende suas canções, são eles os mensageiros, os  intérpretes dos sentimentos que tomam de assalto os nossos corações inebriados com a candura e a plasticidades imantrada dos seus cantares. Quanto aos  letristas? Estes sequer são citados  nas vozes empavonadas dos locutores de rádio, sempre às voltas com o tempo e a próxima canção. É cultural, entre nós... é do jogo.
Para por um ponto final na minha curta explicação e, antecipando-me a uma possível recarga do velho camarada, sublinhei, para voltar ao porto de partida das suas especulações:
"Imagine, mano velho, uma ampla avenida com mais de 20 mil pessoas cantando em uníssono os versos que você os construiu no silencio da noite, você, as suas agonias e reminiscências, na solidão do seu pensamento, agora vocalizado por milhares de almas que se identificaram com a sua mensagem, com a sua alegria, com a sua dor. Gente de todos os matizes, independente de cor, classe social, unidos pelas notas  de uma simples canção, fruto da sua inspiração, filha do seu ventre, do seu intelecto..."
Então, ele abriu os olhos e eu disse: "É esta fortuna que trago impregnada em minha alma, desde que ouvi Dionorina dar os primeiros acordes de 'Porrada de Polícia', na Micareta de l993, e vi este  povão que  amo  entoar do início ao fim os meus versos como se fossem seus, enquanto uns externavam  na cara o drama contido em cada palavra, outros tantos acrescia aos esgares do rosto uma evolução corporal qualquer, indizível para a emoção que me invadira naquele momento. Será que isto tem preço, meu bom camarada?" Ele estendeu-me a mão e, dos seus olhos intrépidos e interrogativos, deixou rolar uma lágrima.
"Porrada de Polícia/ É no fundo da fome que a boca lambe a mesa farta de pavor/ É na fome, é na dor, como porrada de polícia/ Quem mora no morro, mora no morro/ Tristes projetos de vida/ Se corre pro osso é presunto na pista/ Se fica é pirão pra polícia/ Ninguém quer polícia pra ordenar a fila/ Ninguém quer representantes armados do sistema/ Por que não param o trem da Babilônia/ Guerreiros da redenção da raça humana/ Detenham o trem da Babilônia..."     

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