Por Reinaldo Azevedo
Marina Silva é uma esfinge. Sem segredos. O que ela
pensa? Dizer que ninguém sabe é bobagem. Dá, sim, para saber. Não vou cair aqui
na conversa mole de perguntar se Marina vai ou não realinhar as tarifas se,
candidata do PSB, for eleita. É claro que vai. Qualquer que seja o eleito, o
reajuste vai se impor. Contra quem? Contra ninguém. O realinhamento será uma
imposição da realidade. Afinal, o Brasil não é a Venezuela. Se for presidente,
Marina também vai ter de cortar gastos públicos - é o que Dilma ou Aécio terão
de fazer. "Mas tirar dinheiro de onde?" De algum lugar. Ou o país vai para o
vinagre. Nenhuma dessas vulgaridades me interessa. Essa gritaria só serve para
gerar calor. E nenhuma luz.
A Marina que importa é outra. Sim, concordo: é
quase impossível entender o que ela fala, com suas metáforas, alegorias e
derivações impróprias - refiro-me à gramática mesmo! - porque, sei lá, os 340
mil verbetes contidos no "Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa" não lhe
bastam… Faz sentido: pensamentos intraduzíveis pedem palavras… indizíveis. Pode
não dar para entender o que ela diz, o que sempre desperta a suspeita do
sublime, mas dá, sim, para saber o que ela pensa. E ela não pensa coisas boas.
Começo pela questão mais recente. Marina Silva se
desgarrou do PT, como é sabido, mas não se livrou dos piores vícios da
nave-mãe. Querem um exemplo? Ela foi uma das mais entusiasmadas defensoras do
Decreto 8.243, o tal que atrela a administração federal a conselhos populares e
institui, na prática, uma Justiça paralela. Seu "movimento", que não é "partido", combina com aquele estado de permanente mobilização, em que a
militância atropela as instâncias da democracia representativa.
Recuemos um pouco. Como esquecer a atuação de
Marina Silva durante a votação do Código Florestal? Se a sua proposta tivesse
vingado, o país teria sido obrigado, atenção!, a reduzir a área destinada à
agricultura e à agropecuária. O que escrevo aqui não é especulação. É apenas um
fato. É demonstrável. Em 2013, a balança industrial produziu um déficit de US$
105 bilhões, e o setor agropecuário, um superávit de US$ 82,91 bilhões. Isso
para um país que teve um superávit de apenas US$ 2,5 bilhões. E olhem que foi
uma trapaça contábil. De verdade, o saldo foi negativo. Ou por outra: o
agronegócio salva o Brasil da bancarrota, mas Marina Silva queria diminuir a
área plantada.
É o tipo de militância que seduz os descolados e os
ignorantes, mas de ampla repercussão no exterior, especialmente nos países
ricos que acham que devemos deixar a agricultura com eles, enquanto a gente
disputa o cipó com os macacos e foge das onças-pintadas. Todos queremos
preservar a natureza, é claro! Marina queria, de modo irresponsável, dar um
tombo na agricultura e na pecuária. Ela quer economia sustentável? Quem não
quer? A questão é saber o que entende por isso.
Pegue-se agora a questão energética. O Brasil só
não passa por um apagão de fazer 2001 parecer brincadeira de criança porque
cresceu 2,7% em 2011; 0,9% em 2012; 2,1% em 2013 e deve ficar em torno de 0,8%
neste ano. Em 2015, projeções responsáveis apontam que não passa de 1,2%.
Estivesse crescendo, como precisa, a pelo menos 4%, já estaríamos no escuro.
Mesmo assim, ainda que tente aqui e ali dizer o
contrário, Marina se opôs, sim, à construção da usina de Belo Monte. Tanto é
que apoiou um vídeo imbecil chamado "Gota d'Água", que dizia uma impressionante
coleção de bobagens a respeito da usina. Mais: esse empreendimento será
subutilizado, sim, porque Belo Monte não terá reservatório. Será do modelo fio
d'água. Pesquisem a respeito. Só se fez essa escolha errada por causa da
militância ambientalista que Marina representa, já que se inunda uma área muito
menor, mas se produz, em contrapartida, bem menos energia.
Em 2010, a Marina candidata foi ao programa "Roda Viva" e tratou do assunto. Como fala pelos cotovelos, impede que o pensamento
de seus interlocutores respire. Vejam o vídeo acima.
Volto em seguida.
Volto em seguida.
Em primeiro lugar, houve, sim, os devidos cuidados
ambientais. Em segundo lugar, a tese da inviabilidade econômica é de uma
impressionante falácia. De fato, Belo Monte tem mais dinheiro público do que
deveria, mas isso se deve ao viés esquerdizante do governo petista - que Marina
não combate. O capital privado só refugou porque o preço que o governo queria
pagar pela energia era incompatível com a realidade. Ou por outra: quando os
petistas decidiram tabelar o lucro - prática hoje em dia vigente apenas em Cuba
e na Coreia do Norte -, Marina se calou. O negócio dela era com os bagres. Sim,
preservemos os bagres. Mas e a energia elétrica? Mais: se o governo tivesse
dado de ombros para o ambientalismo doidivanas e construído a usina com
reservatório, mais energia seria produzida. Ou por outra: Belo Monte só não vai
render o que poderia por causa do espírito marineiro.
Trato aí de duas questões que hoje são essenciais
ao país: balança comercial e produção energética. Nos dois casos, a possível
candidata do PSB à Presidência estava do lado absolutamente errado do debate.
Errado por quê? Porque as suas escolhas contribuiriam para afundar o país - e,
como é sabido, em casos assim, os pobres pagam o preço primeiro.
Questão política
Não e só isso. Marina fala em nome de uma tal "nova política" que ninguém, até agora ao menos, entendeu direito o que é. É impossível governar o país sem o Congresso, a menos que se queira gerar uma crise institucional dos diabos. Em sua pregação, ela dá a entender que políticos são sempre os outros, nunca ela própria. Por quê? Porque acredita na tal da "mobilização em rede", que vem a ser a prima rica - e com nível universitário - de movimentos como o MST ou MTST. Nem por isso menos autoritários.
Não e só isso. Marina fala em nome de uma tal "nova política" que ninguém, até agora ao menos, entendeu direito o que é. É impossível governar o país sem o Congresso, a menos que se queira gerar uma crise institucional dos diabos. Em sua pregação, ela dá a entender que políticos são sempre os outros, nunca ela própria. Por quê? Porque acredita na tal da "mobilização em rede", que vem a ser a prima rica - e com nível universitário - de movimentos como o MST ou MTST. Nem por isso menos autoritários.
Na verdade, nesse particular, ela vai até um pouco
além. Por mais que queira negar, parte do mau espírito das ruas - e não do bom - de junho do ano passado a esta data contou com o seu apoio silencioso. Ela
pode se tornar a única beneficiária do ódio à política que tomou as ruas. E é
evidente que esse tal espírito não me agrada. A propósito: alguém leu ou ouviu
alguma censura de Marina aos black blocs?
O fato de a possível candidata do PSB ter hoje "conselheiros" com uma visão, digamos, mais à direita em economia do que o
petismo não me seduz absolutamente. Na verdade, do meu ponto de vista, só torna
a equação ainda mais confusa porque não vejo como ela poderia incentivar com a
mão esquerda o espírito militante e procurar conter com a direita o rombo nos
cofres públicos. Ou por outra: o discurso ideológico de Marina atenta contra o
caixa, mas ela se cerca de gurus econômicos que fazem profissão de fé na
responsabilidade fiscal.
Na minha coluna de hoje na Folha, critico as
patrulhas petistas - ou a seu serviço - que tentam impedir que se formule um
pensamento alternativo no Brasil. Busca-se deslegitimar desde a origem qualquer
crítica organizada ao governo e ao partido oficial. Aécio Neves, do PSDB, é
vítima desse procedimento. Eduardo Campos também era. Será que estou a fazer o
mesmo com Marina? Uma ova! Estou é criticando aqui o que conheço de sua
militância e dizendo por que ela não me serve. Em muitos aspectos, Marina pode
representar um perigo ainda maior do que o petismo.
Se ela se eleger presidente e puser em prática o
que pensa sobre militância organizada, a relação com os Poderes instituídos, o
agronegócio e o setor energético, quebra o país e o conduz a uma crise política
sem precedentes. Claro! Uma Marina que conseguisse governar teria de jogar fora
a Marina "sonhática", que está muito mais para "pesadêlica".
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
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