Por Merval Pereira
Sem ter como desmentir as
recentes denúncias de manipulação criminosa, os governistas e sua vasta rede de
militantes que atuam na internet passaram a uma bem orquestrada ação de
banalização dessas atividades ilegais, como se fossem corriqueiras. É o caso da
preparação dos ex-diretores da Petrobras para depoimentos na CPI que apura a
compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, acusada pelo Tribunal de
Contas da União (TCU) de prejudicial aos cofres da empresa.
A própria presidente Dilma
abriu essa discussão ao acusar publicamente o ex-diretor Nestor Cerveró de ter
produzido um relatório falho tecnicamente, que induziu o Conselho Administrativo
da Petrobras, presidido por ela na ocasião, ao erro de aprovar uma transação
que se mostrou equivocada. Pois bem, como é sabido a Petrobras demitiu Cerveró,
que à época trabalhava na BR Distribuidora, e a própria presidente da estatal,
Graça Foster, admitiu no Congresso que aquela não fora uma boa compra.
Descobre-se agora que a Petrobras está pagando as multas com que os
ex-diretores foram punidos pelo TCU, e que todos eles, inclusive o culpado pelo
prejuízo, estavam recebendo orientações especiais e treinamento para o
depoimento na CPI da Petrobras.
Não bastasse a estranheza
de a estatal prejudicada bancar a defesa de ex-diretores acusados de
malversação de dinheiro público, gravações de uma reunião na sede da Petrobras
revelaram que a chegada de Cerveró à sede da empresa foi cercada de
preocupações e cautelas para que sua presença não fosse notada. E que as
perguntas que seriam feitas a ele e a outros diretores já estavam previamente
preparadas pelos próprios membros da CPI da base aliada do governo.
O ministro das Comunicações
Paulo Bernardo, para justificar essa tramoia, deu uma declaração absolutamente
absurda: segundo ele, desde Pedro Álvares Cabral, as CPIs são arranjadas.
Esqueceu-se de que a CPI que derrubou o então presidente Collor foi liderada
pelo PT, e que outras, como a dos Correios, acabaram levando à cadeia diversos
líderes petistas envolvidos no mensalão.
Na verdade, as CPIs, um
instrumento das minorias, sempre tiveram papel importante no desvendar de atos
corruptos, e só quando a maioria resolve boicotá-la é que se transforma em uma
farsa como a da Petrobras. Na própria gravação é possível ouvir os advogados da
Petrobras procurando uma maneira segura de enviar as perguntas a José
Gabrielli, ex-presidente da Petrobras, o que não seria necessário se não fosse
um ato escuso. Treinar os depoentes em CPIs é uma coisa, montar uma farsa com
perguntas previamente combinadas é outra muito diferente. A mesma coisa
acontece com o caso dos perfis da Wikipédia alterados por pessoas de dentro do
Palácio do Planalto.
Que a Wikipédia é um
ambiente aberto a todos, ninguém discute. Mas a inclusão de informações
inverídicas e calúnias no perfil de alguém não pode ser considerada normal.
Especialmente se essas ações são feitas no Palácio do Planalto, de onde saíram
mais de 200 alterações em diversos perfis, muitas para incluir elogios a
pessoas do governo, outras para atacar jornalistas independentes como Míriam
Leitão ou Carlos Alberto Sardenberg.
A própria presidente Dilma,
ao repudiar a ação, cometeu um ato falho ao dizer que "nesse caso específico, é
algo que quem quiser fazer individualmente que faça, mas não coloque o governo
no meio." A fala da presidente é reveladora de uma maneira de pensar a luta
política: distorcer informações sobre pessoas consideradas inimigas do governo
pode ser uma atividade política que alguns utilizam, desde que não coloque
embaraços para o governo.
Que a guerrilha virtual é
uma atividade corriqueira dos petistas, já é sabido. A novidade, que agrava a
situação, é que agora essa prática criminosa está sendo feita de dentro do
Palácio do Planalto, numa demonstração de que não há mais um mínimo de
separação entre o governo e a campanha eleitoral, até mesmo nas ações mais
baixas. É uma ação de guerrilha de dentro do palácio do governo. Como a
presidente pode lavar as mãos? Não há cadeia de comando? Nem dentro do
Planalto? Como o Gilberto Carvalho pode dizer que foi “uma bobagem” e ficar
tudo bem?
Nesse caso, pelo menos
politicamente, o ônus da prova se inverte. É a Presidência que precisa entregar
o culpado e provar que era um aloprado celerado agindo por conta própria. Caso
contrário, é como se o Nixon dissesse que quem instalou aquelas escutas no
prédio Watergate foram uns aloprados do Partido Republicano.
Fonte: "O Globo"
Nenhum comentário:
Postar um comentário