Por Merval
Pereira
É meio vergonhoso para o PT, há dez
anos no poder, que a situação desumana de nosso sistema penitenciário vire tema
de debate só agora que líderes petistas estão sendo condenados a penas que
implicam necessariamente regime fechado.
Chega a ser patético que o ministro
da Justiça, José Eduardo Cardozo, no final das contas responsável pelo
monitoramento das condições em que as penas são cumpridas, diga em público que
preferiria morrer caso fosse condenado a muitos anos de prisão.
Dois anos no cargo, e o ministro só
se mobiliza para pôr a situação das prisões brasileiras em discussão no momento
em que companheiros seus de partido são condenados a sentir na própria pele as
situações degradantes a que presos comuns estão expostos há muitos e muitos
anos, os dez últimos sob o comando do PT.
Também o ministro revisor Ricardo
Lewandowski apressou-se a anunciar que muito provavelmente o ex-presidente do
PT José Genoino vai cumprir sua pena em prisão domiciliar porque não há vagas
nos estabelecimentos penais apropriados para reclusões em regime semiaberto.
Para culminar, vem Dias Toffoli
defender que as condenações restritivas da liberdade sejam trocadas por penas
alternativas e multas em dinheiro. Tudo parece compor um quadro conspiratório
para tentar evitar que os condenados pelo mensalão acabem indo para a cadeia,
última barreira a ser superada para que a impunidade que vigora para crimes
cometidos por poderosos e ricos deixe de ser a regra.
Dias Toffolli, para justificar sua
tentativa de tirar da cadeia os petistas condenados, defendeu a tese de que
eram meros assaltantes dos cofres públicos, sem objetivos políticos: "Os réus
cometeram desvios com intuito financeiro, não atentaram contra a democracia,
que é mais sólida que tudo isso! Era o vil metal. Que se pague com o vil
metal."
Luiz Fux chegou a lembrar que apenas
o Congresso pode mudar o Código Penal, que no momento estipula penas
restritivas de liberdade para o tipo de crime que está sendo julgado.
Gilmar Mendes, que, quando foi
presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), comandou mutirão nacional
para regularizar a situação de condenados em situação irregular nas cadeias
depois de cumpridas as penas, lamentou que o ministro da Justiça tivesse falado
só agora, "já que esse tema é conhecido desde sempre e é muito sério".
Ele não esqueceu a culpa da própria
Justiça, que "não consegue julgar no tempo adequado estas questões", mas
ressaltou que "há uma grande responsabilidade de todos os governos se aí não há
recursos para fazer presídios".
O decano do Supremo, Celso de Mello,
foi objetivo sobre "a grande a responsabilidade do Ministério da Justiça",
lembrando que um dos órgãos mais expressivos na estrutura penitenciária é o
Departamento Penitenciário Nacional, ao qual cabe acompanhar as normas de
execução penal em todo o território nacional, fiscalizar periodicamente o
sistema prisional.
"O que temos visto no sistema
prisional brasileiro é um depósito de presos, pessoas abandonadas à própria
sorte por irresponsabilidade do poder público. É importante que o ministro
tenha feito essa observação de maneira muito cândida, mas é preciso que o poder
público exerça a parte executiva, sob pena de se frustrar a finalidade para a
qual a pena foi concebida", ressaltou Celso de Mello.
Para o decano da Corte, a prática da
lei de execução penal "tornou-se um exercício irresponsável de ficção jurídica,
uma vez que o Estado mantém-se desinteressado desta fase delicadíssima de
implantação das sanções penais proclamadas pelo Poder Judiciário".
E lembrou que um artigo da lei de
execução penal determina que a pena deve ser cumprida em um local com
dormitório, aparelho sanitário e lavatório, salubridade do ambiente, área
mínima de seis metros quadrados. E o que se tem em realidade é um "inferno
carcerário".
Querer evitar a prisão de políticos
poderosos e banqueiros pretextando a péssima situação de nosso sistema
carcerário é debochar da opinião pública, menosprezar os que já estão vivendo
essa situação degradante e não encarar um problema gravíssimo que exige
política de governo em vez de uma esdrúxula campanha.
Fonte: "O Globo"
Um comentário:
Se eu fôsse o Lula, puxaria as orelhas de Cardozo, o ministro da justiça. Afinal, o que ele fez foi dizer que o gov de Lula foi uma M, no que se refere à justiça e ao sistema prisional. Claro, nunca pensou que os seus e quem sabe, até êle, no futuro, venha a ter que se hospedar numa das cadeias do país.
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