Por
Reinaldo Azevedo
Ontem, eu
lhes fiz um desafio: explicar por que Erundina está errada ao dizer que o PT
ajuda a "higienizar" a imagem de Maluf. Abaixo, num daqueles textões (!),
explico por que a aliança é absolutamente coerente e por que é Maluf quem
contribui para lavar a imagem do partido, que o utiliza como instrumento na
consolidação de seu projeto autoritário. Acho que ficou bacana. Se gostarem,
debatam e passem adiante.
*
Vocês perceberam, caros leitores, dada a aliança do PT com Maluf, o tom choroso, lacrimejante, funéreo, de muitos colunistas "isentos", como se estivessem assistindo à queda de um puro ou à morte de uma utopia? Alguns chegaram mesmo a encomendar as exéquias do antigo "partido ético", "diferente de tudo o que está aí". Houve os que fizeram como José Saramago quando Fidel Castro mandou fuzilar, em 2003, sem julgamento, três dissidentes que haviam tentado fugir de Cuba: "Até aqui fui com Fidel, agora não mais". Pô!!! O barbudo assassino já era responsável por 100 mil mortes, e Saramago tinha ido com ele "até ali"??? Aquelas três a mais, no entanto, mexeram com seu coração humanista… Assim fizeram certos analistas "isentos": "Até aqui fui com o PT; agora não mais!". Faço a eles pergunta semelhante à que fiz à época a Saramago: "Por quê? Tudo o que PT havia feito até então parecia pouco?".
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Vocês perceberam, caros leitores, dada a aliança do PT com Maluf, o tom choroso, lacrimejante, funéreo, de muitos colunistas "isentos", como se estivessem assistindo à queda de um puro ou à morte de uma utopia? Alguns chegaram mesmo a encomendar as exéquias do antigo "partido ético", "diferente de tudo o que está aí". Houve os que fizeram como José Saramago quando Fidel Castro mandou fuzilar, em 2003, sem julgamento, três dissidentes que haviam tentado fugir de Cuba: "Até aqui fui com Fidel, agora não mais". Pô!!! O barbudo assassino já era responsável por 100 mil mortes, e Saramago tinha ido com ele "até ali"??? Aquelas três a mais, no entanto, mexeram com seu coração humanista… Assim fizeram certos analistas "isentos": "Até aqui fui com o PT; agora não mais!". Faço a eles pergunta semelhante à que fiz à época a Saramago: "Por quê? Tudo o que PT havia feito até então parecia pouco?".
Luiza Erundina,
que foi vice por dois dias na chapa de Fernando Haddad, recorreu a uma imagem
que vira emblema dessa leitura torta sobre o PT: "Maluf quer aparecer
em outra imagem, que não aquela de estar sendo procurado pela Interpol. Ele se
higieniza ao lado de forças que não têm nada a ver com o malufismo. Somos do
outro lado. Só quem ganha nisso é ele, aparecendo, falando comemorando junto. É
todo o significado que tem”. Erundina está absurdamente errada porque,
e vou demonstrar isto aqui, o que se tem é justamente o contrário - e alguns
leitores acertaram na mosca: É O PT QUE USA MALUF PARA SE HIGIENIZAR,
DEPUTADA, NÃO O CONTRÁRIO! No projeto de poder petista, quem, para ficar
no paradigma vocabular escolhido, "suja" o PT é Erundina; Maluf, ao contrário,
ainda que a muitos pareça incrível, ajuda a "lavar" o projeto hegemônico. Vou
explicar tudo direitinho. Antes, uma questão de natureza conceitual.
A questão
conceitual
Um partido - e isto é teoria política, não paranoia, como acusaria aquele economista que tem de se conter para não cair de boca no Sonho de Valsa - está a caminho de construir a hegemonia quando determina até os critérios segundo os quais será criticado. Ou por outra: quando aqueles que se opõem a suas orientações o fazem segundo marcos que ele próprio estabeleceu. Eis o partido tornado, como queria o teórico comunista Antonio Gramsci, "um novo imperativo categórico", um "laicismo moderno", de sorte que tudo o que se pensa só faz sentido segundo o que é e o que não é útil a esse partido.
Um partido - e isto é teoria política, não paranoia, como acusaria aquele economista que tem de se conter para não cair de boca no Sonho de Valsa - está a caminho de construir a hegemonia quando determina até os critérios segundo os quais será criticado. Ou por outra: quando aqueles que se opõem a suas orientações o fazem segundo marcos que ele próprio estabeleceu. Eis o partido tornado, como queria o teórico comunista Antonio Gramsci, "um novo imperativo categórico", um "laicismo moderno", de sorte que tudo o que se pensa só faz sentido segundo o que é e o que não é útil a esse partido.
Ora, quando Maluf
é contrastado com o petismo, tomando-se o deputado do PP como símbolo de tudo o
que há de ruim na política brasileira - e isso, em si, é verdade -, está-se partindo
de um pressuposto, PETISTA EM ESSÊNCIA, segundo o qual o PT é, então, a
antítese de Maluf. O erro é brutal e se dá em duas dimensões, uma mais rasa,
revelada pelo noticiário cotidiano, e outra mais profunda, que requer algumas
especulações além da notícia. Fixemo-nos primeiro na dimensão mais superficial
do engano, e demonstrá-la é tarefa simples. Pode alguém advogar a pureza ética,
ora supostamente conspurcada, do partido que fez o mensalão? Pode alguém
advogar a pureza ética, ora supostamente maculada, do partido que patrocinou o
escândalo dos aloprados? Pode alguém advogar a pureza ética, ora supostamente
violada, do partido capaz de criar uma CPI para perseguir adversários, tentando
impedir que uma central de escândalos como a Delta seja investigada?
Que pureza de
lupanar é essa?
Calma aí, senhoras
carpideiras, a derramar cachoeiras de lamentos por causa dos descaminhos do
partido puro! Em que a moralidade de Paulo Maluf é essencialmente diferente da
moralidade dos petistas? Maluf é pior do que José Dirceu? Por quê? Lambanças
acabam de derrubar o presidente do Banco do Nordeste - sim, em razão de
reportagens da imprensa que os vigaristas chamam "golpista". Ele era homem do
deputado federal José Nobre (PT-CE), chefe daquele pobre-coitado que foi flagrado,
em 2005, com a cueca cheia de dólares, notoriamente mero pau-mandado. Nobre,
calculem, é considerado figura em ascensão no partido. É irmão de José Genoino,
presidente do PT quando estourou o escândalo do mensalão e um dos réus no
processo que tramita no STF. Ora, por que, afinal de contas, Maluf não pode se
juntar com o PT? Dólares ilegais na cueca, nas Ilhas Jersey ou num banco em
Miami para pagar Duda Mendonça pela campanha eleitoral de Lula, qual é a
diferença? Eu lhes conto qual é a diferença: Maluf há tempos é tratado, e com
razão, como uma figura detestável da política, e Lula, o chefe da organização
petista, é considerado um herói. Inclusive por esses que ficam derramando
lágrimas. Será que Maluf não pode se juntar com o governo que levou a Caixa
Econômica Federal a comprar o Panamericano, um banco quebrado?
Por que não?
Eis a dimensão que
chamo mais rasa, que pode ser percebida com uma simples pesquisa no Google. O
elenco de malfeitos e de operações suspeitas do petismo no governo federal - e,
se quiserem, de administrações estaduais e municipais - referenda uma
observação que já se fez aqui: a diferença entre Maluf e o PT é aquela que
existe em "Era Uma Vez no Oeste" entre a pistolagem que chegava a cavalo -
bruta, mas algo romântica - e aquela que vinha de trem: não menos bruta, mas já
profissional.
A dimensão
profunda
Agora vamos à dimensão mais profunda, esta mais difícil de detectar porque requer algum aporte teórico para entender o projeto de poder petista. De saída, cumpre notar: os petistas não são socialistas à moda antiga, do tipo que ainda mandam flores… vermelhas para a camarada. Isso é uma bobagem - a rigor, nunca chegou a ser assim. O próprio Babalorixá de Banânia, como o jornalista José Nêumanne demonstra em detalhes no livro "O Que Sei de Lula", jamais foi de esquerda. Ao contrário até: tem uma visão de mundo que as esquerdistas de antigamente chamariam "conservadora". E sempre soube se orientar muito bem nos bastidores do poder. Tudo bem analisado, a sua ascensão no sindicalismo, leiam lá, se deveu a uma espécie de golpe desferido contra antigos "companheiros". Muito bem, dito isso, vamos adiante.
Agora vamos à dimensão mais profunda, esta mais difícil de detectar porque requer algum aporte teórico para entender o projeto de poder petista. De saída, cumpre notar: os petistas não são socialistas à moda antiga, do tipo que ainda mandam flores… vermelhas para a camarada. Isso é uma bobagem - a rigor, nunca chegou a ser assim. O próprio Babalorixá de Banânia, como o jornalista José Nêumanne demonstra em detalhes no livro "O Que Sei de Lula", jamais foi de esquerda. Ao contrário até: tem uma visão de mundo que as esquerdistas de antigamente chamariam "conservadora". E sempre soube se orientar muito bem nos bastidores do poder. Tudo bem analisado, a sua ascensão no sindicalismo, leiam lá, se deveu a uma espécie de golpe desferido contra antigos "companheiros". Muito bem, dito isso, vamos adiante.
Lula não é de
esquerda, mas é autoritário. Suas decisões recentes no partido o comprovam à
larga. Esse autoritarismo se estende também à sua concepção de poder.
Influenciado pelas esquerdas - sim, elas existiam - que ajudaram a criar o PT,
o Apedeuta passou um bom tempo fazendo um discurso com forte conteúdo
classista, com sotaque socializante, avesso a alianças com "partidos da burguesia"
ou com "forças conservadoras". Na face indigna de sua história, o homem que
agora vai à casa de Paulo Maluf recusou o apoio de Ulysses Guimarães no segundo
turno das eleições de 1989, contra Fernando Collor. Escrevo de novo: o homem
que repudiou o apoio de Ulysses e que proibiu seu partido de participar do
colégio eleitoral que elegeu Tancredo Neves foi prestar homenagens a Maluf -
nada menos do que o adversário de Tancredo no Colégio Eleitoral!
Política
de alianças
Num dado momento, o PT percebeu fragilidades e fissuras na política brasileira. ATENÇÃO PARA ISTO: em vez de corrigidas, pensaram os chefões, elas deveriam ser revertidas em ações benéficas à construção, consolidação e fortalecimento do partido. E decidiram, então, aderir às alianças políticas. Socialista à moda antiga o partido não era. Mas autoritário sempre foi e é. Desde que mudou a sua prática - E AQUI ESTÁ O BUSÍLIS PRINCIPAL DESTA ANÁLISE - e passou a fazer composições, os petistas buscam de modo obcecado forças antes ditas "conservadoras". O objetivo é "lavar", disfarçar, travestir o projeto político do partido, que continua o mesmo: constituir-se como Partido Único. "Ah, como Reinaldo é paranoico!", diriam os comedores de bombons. "Isso é impossível no Brasil!" Não se trata, bobinhos, de partido único à moda cubana ou chinesa (bem que eles gostariam, mas sabem ser impossível). Trata-se de deter a hegemonia do processo político de tal sorte que as demais forças organizadas da sociedade se tornem irrelevantes. E não só as da política. Gilberto Carvalho, sempre ele!, alertou os petistas para a necessidade de comçear a enfrentar os evangélicos, como vocês bem se lembram.
Num dado momento, o PT percebeu fragilidades e fissuras na política brasileira. ATENÇÃO PARA ISTO: em vez de corrigidas, pensaram os chefões, elas deveriam ser revertidas em ações benéficas à construção, consolidação e fortalecimento do partido. E decidiram, então, aderir às alianças políticas. Socialista à moda antiga o partido não era. Mas autoritário sempre foi e é. Desde que mudou a sua prática - E AQUI ESTÁ O BUSÍLIS PRINCIPAL DESTA ANÁLISE - e passou a fazer composições, os petistas buscam de modo obcecado forças antes ditas "conservadoras". O objetivo é "lavar", disfarçar, travestir o projeto político do partido, que continua o mesmo: constituir-se como Partido Único. "Ah, como Reinaldo é paranoico!", diriam os comedores de bombons. "Isso é impossível no Brasil!" Não se trata, bobinhos, de partido único à moda cubana ou chinesa (bem que eles gostariam, mas sabem ser impossível). Trata-se de deter a hegemonia do processo político de tal sorte que as demais forças organizadas da sociedade se tornem irrelevantes. E não só as da política. Gilberto Carvalho, sempre ele!, alertou os petistas para a necessidade de comçear a enfrentar os evangélicos, como vocês bem se lembram.
Em 2002, o PT
escreveu a sua carta de conversão ao capitalismo porque pesava ainda uma, em
muitos aspectos, injusta desconfiança sobre a adesão do partido à economia de
mercado. Muito modestamente, então no site e revista Primeira Leitura, escrevi
algo assim: "Vamos parar de besteira! O PT não é candidato a implementar o
socialismo no Brasil; ele é candidato a pôr a sua canga no capitalismo que
temos". Acho que acertei. Cercado de desconfiança, o partido deu a potentados
do capital financeiro e industrial o que eles não teriam ousado pedir a um
"partido de direita".
Entenda o partido
que a senhora ajudou a criar e do qual teve de sair, deputada Erundina! O PT
precisa de forças que ele próprio chama "de direita" para tentar aniquilar
qualquer um que lhe faça oposição. Em 2002, quando buscava um vice, a única
exigência era esta: tinha de ser do campo conservador. E encontraram o então
senador José Alencar. Ora, é evidente que o PSDB ou José Serra estão à
esquerda, respectivamente, de PP e Paulo Maluf! Ocorre que esses dois não
representam empecilho ao tal projeto hegemônico - logo, são aliados. ASSIM, NÃO
É MALUF QUE BUSCA O PT PARA SE HIGIENIZAR. É O PT QUE BUSCA MALUF PARA, A UM SÓ
TEMPO, EXIBIR A SUA FACE SUPOSTAMENTE PLURAL, TOLERANTE E INCLUSIVA E PARA DAR
PROSSEGUIMENTO AO PROJETO DO PARTIDO ÚNICO.
Gilberto Carvalho
confessou isso anteontem com clareza inequívoca. Defendeu a aliança com Maluf
deixando claro que o PT está no comando. José Dirceu fez a mesma coisa. Quem
não cabe nesse processo é justamente Luiza Erundina - não por acaso, pertencia
ao partido e teve de deixá-lo. Ela já não cabe porque fala aquela linguagem do
socialismo à moda antiga - chegou até a evocar "a luta de classes". Ela já não
cabe porque relembra aquele partido que queria se dirigir aos "oprimidos" (e o
PT é hoje uma força da ordem, que tem muita intimidade com os que a ex-prefeita
considera "opressores"). Ela já não cabe porque cria obstáculos à aliança com o
capeta se o capeta ajudar a vencer o único núcleo mais ou menos organizado que
ainda pode liderar uma resistência ao PT: os tucanos! A propósito: não foi Lula
quem disse que Jesus Cristo, se voltasse à terra, acabaria tendo de se aliar ao
demônio? O "cristo" de Lula, por óbvio, é uma criação à sua imagem e
semelhança.
Não sei se o PT
será bem ou malsucedido ao se aliar a Maluf. O que sei é que a aliança é
absolutamente coerente porque não há entre eles diferença nenhuma de moralidade
- a do deputado do PP leva alguma vantagem porque ligeiramente menos cínica - e
porque Maluf é mais um, vá lá, "conservador" cooptado na saga para aniquilar o
que resta de oposição no país. Assim, ele é, a um só tempo, uma conquista e uma
presa. E olhem, para citar Lula, que o ex-prefeito, muito provavelmente, ainda
não é o diabo. Imaginem quando chegar a hora…
Fonte: "Blog Reinaldo Azevedo"
2 comentários:
É a fome se juntando com a vontade de comer.
Erundina, em parte, está certa, porque Maluf quer mesmo é ficar bem com o eleitorado petista, que sabemos, não é pouco. Por sua vez, Lula que não quer parecer gostar de Maluf, mas que venderia até a própria Lindu prá ganhar mais alguns aliados(votos), não se importou a minima de abraçar o libanês no jardim dêle.
Aliás, Lula adora fazer(ou falar) besteiras em belos jardins.
Coitada de D. Lindú. KKKKKKKKKKKKKK... ELA JÁ DEVE TER SIDO VENDIDA POR VÁRIAS VEZES. KKKKKKKKKKKK...
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